Clube da Menô

A minha vida só é possível incrementada!

Textos

Texto escrito em abril de 2007

Visita de médico I – Aeroporto 2007

Depois de muitos anos revi uma família que eu amo muito. O marido é “amigo” do namorado atual da Dona Menô, o Juvenal; a esposa foi minha parceira, atuando como psicóloga na época das palestras de gestantes; a filha mais novinha nasceu pelas minhas mãos; a mais velha será enfermeira, canta e toca muito bem; o filho estava em outra cidade, mas, pelo que vejo nas fotos, ficou um homem lindo.
Eu não tenho religião específica, mas estive na casa de pessoas religiosas que me deixaram à vontade, mesmo com meu jeito maluco de ser. Posso dizer que eu não ria tanto há muito tempo e não ficava tão à vontade na casa de alguém.
Chorar de rir – esta é a expressão: Eu chorei de rir naqueles dias e aproveitamos muito, apesar do pouquíssimo tempo em que estive naquele Estado tão lindo.
Fui uma “turista acidental” e vi uma parte do meu País que nunca tive interesse em conhecer antes.
Por isso, eu passo a minha “declaração de amor” à minha terra, através do que vi, estudei e pesquisei, falando um pouco sobre Goiás.
Depois Dona Menô também vai falar, mas, por hora, vamos às coisas sérias ou meio sérias...
Vou colocar tudo em palavras simples, sem frescuras, como um ser humano virgem de informações e que observa a realidade nua e crua.
Graças a Deus fui lá uma semana antes de os controladores de vôo fazerem a última greve (última até esta carta, pois acredito que muitas ainda virão). Por isso, não peguei tráfego aéreo nenhum e tudo correu na mais “perfeita ordem”, não fosse pela minha “síndrome de avião”, ou seja lá como chamam...
Eu tenho náuseas quando aquele troço começa a decolar e fico com o ouvido entupido a viagem toda. Minha pressão arterial baixa, eu respiro superficialmente, acho que vou desmaiar e fico meio que boba, mas, com vergonha de pedir ajuda. Fico esperando que alguém me encontre gelada e cadavérica na cadeira e me leve para um CTI... Olho para os que estão ao lado e me controlo de acordo com a cara deles. Se estão distraídos, eu me sinto bem. Se arregalam os olhos, eu fico desesperada.
Fiz escala em São Paulo, no aeroporto de Congonhas – o caos do Demo. Se o Demo existe ele deve fazer point no Aeroporto de Congonhas, na nossa capital não oficial, só pra nos sacanear...
Estava um calor estranho, já que Sampa é frio que nem meu freezer...A coisa lá estava tão cheia e bagunçada que tivemos que pegar um micro-ônibus até outro portão de embarque.
Coisa mesmo dos infernos... Se eu fosse rica pegava embarque direto, sem escalas, mas pobre pega escala de aviões, paga a passagem à prestação e leva bagagem na mão para não ser roubado - como se houvesse grande coisa nela...
Uma mala não deixaram que eu levasse nas mãos. O cara falou que estava pesada. Eu disse que era forte e podia carregar, mas meus argumentos foram em vão. Pensei o tempo todo no meu desodorante e meu champú preferidos sendo extraviados...
Depois de umas duas horas de vôo para Goiás e ter tomado todos os sucos de pêssego e comido mil biscoitos de goiaba, eu comecei a me acalmar. Até porque vim ao lado de um casal maravilhoso que me divertiu falando sobre as propriedades do pequi.
Pararemos aqui para dizer o que é pequi:
O pequi é uma fruta nativa do cerrado brasileiro, muito utilizada na cozinha nordestina, no Centro-Oeste do Brasil e Norte de Minas Gerais. É o símbolo da culinária goianense. Apesar de florescer entre setembro a fevereiro, eles a guardam em conservas. No século XVIII começou a ser usada como sabão. Só que, pelo cheiro e sabor diferentes, eles a usam para a culinária, como tempero e até licor.
Dizem que é afroidisíaco... Só se for algo parecido com o que comia o Marquês de Sade... A polpa é macia, mas temos que a raspar com os dentes com cuidado para não mordermos o caroço, que possue espinhos, espeta o céu da boca e a língua, causando dores horrorosas.
Sádico e afrodisíaco... Boa combinação!
O cheiro e o gosto me pareceram de um maracujá com manteiga. Prefiro ficar com a minha Coca–Cola light... Eles o colocam no arroz, na galinha e em tudo que for comestível.
Eu o trouxe para casa para comer por aqui, com calma. Quando comi a polpa, pensei que era parecido com champingnon. Tal foi minha surpresa que eu revolvi tudo no meu estômago da mesma forma que um ruminnante... ODIEI! Tirou o meu tesão!
Mas, por lá eu caí dentro nos peixes maravilhosos de água doce, como Tambaqui, Tucunaré e Lambari. Faltou o Pintado. Da da próxima vez eu serei convidada para um jantar de honra, se não for fulminada pelos meus textos...
Voltando ao vôo:
Tudo se apaziguou quando eu entrei na área de Goiás. Eu vi o céu mais lindo de minha vida e continiuei o vendo por todos os dias que estive lá. Um azul inigualável, nuvens imensas, tudo aberto, tudo grande, tudo largo!
Lá do avião eu olhei pra baixo e só via terra, terra e mais terra. Tudo coberto com matas, muitos rios, muita água, muita plantação, muito gado.
Eu acho que um estrangeiro jamais vai entender a grandiosidade que é nossa terra e nossas riquezas. Quando se lê sobre estatísticas e números, dimensões e coisa e tal, não se tem a noção exata do que se pode ver pelos próprios olhos.
A natureza prepondera, apesar do desmatamento. O humano ainda não venceu este milagre de Deus, mas vemos áreas devastadas em função de abrirem terrenos para plantio, para o o gado, construções e para a exploração das madeiras nobres e minério.
Muitos anos levarão até se recompor o que estão fazendo com o nosso Brasil. A exploração é muitas vezes disciriminatória, sem infra-estrutura para conservação da biodiversividade. Manter o replantio em uma área extensa, procurando sustentar o original, é tarefa árdua e cara; conter o assassinato dos animais, impedir a destruição do solo e da vegetação, permitir a distribuição justa de terras são tarefas que podem levar à morte num paraíso de riquezas e “ricos”.
A gente vê buracos secos no solo. A gente vê maravilhas do céu misturadas ao descaso dos seres humanos. Vemos rios tortuosos seivando florestas verde-escuro e vemos a mão do homem, tanto racionalmente, quanto irracionalmente, tocando a natureza.
Deu vontade de chorar de emoção. Nestas horas a gente se comunica com nossas raízes. Senti orgulho de ter sangue brasileiro e fazer parte deste país maravilhoso, que, apesar de ser administrado por alguns imbecis, é ainda um sobrevivente - o pulmão do mundo, o responsável pela ecologia mundial.
Aportar!
Lembrei do “Samba do Avião”, de Tom Jobin, quando ele chegou no Rio de Janeiro:
“Apertem o cinto, vamos chegar. Água brilhando, olha a pista chegando. E vamos nós aterrar...”.
Passou o enjoo todo e o ouvido ficou totalmente livre da pressão intracraniana, até porque eu bocejava e engolia o tempo todo. Na hora de pousar, eu senti que o piloto deu uma guinada básica para a esquerda e “bobeou no volante”... Era como se eu estivesse numa nojenta montanha russa ou naquele “Cabum” maldito que existe no Parque da Xuxa...
Soube no dia seguinte que o avião teve problemas em se desviar de outro avião, que teria tido um “pouso forçado” minutos antes...
Nesta hora eu precisei de uma “mão”.
Já perceberam que quando a gente está diante de uma catástrofe e não pode sair dela, a coisa mais importante é pegar na mão de alguém e entregar pra Deus?
Eu quis pegar apertado a mão da mineirinha que ficou minha amiga, mas para não cometer mico, eu me controlei e comecei a tirar meleca...
Que se dane os outros! Se eu tivesse que chegar no Céu - ou nos infernos - não gostaria de ter meleca no nariz!
Depois veio aquele horror de aterrissar. As rodas fazem barulho, a gente é projetada pra frente. Nós olhamos para as aeromoças, que estão todas sorridentes, mas com os dentes trincados. Na hora mais crítica elas desaparecem e eu penso que irão aparecer aterrorizadas, segurando nas cadeiras e dizendo:
“Senhoras e senhores, houve um pequeno contratempo e uma pedrinha fez o maior rebú no trem de pouso. Por favor, delicadamente, queiram colocar suas cabeças no colo e rezem! Vamos bater de frente com os seus parentes!”.
De repente, como por encanto, o avião pára e todos se levantam, sem organização, atrapalhando todo mundo, numa felicidade que não há igual.
Eu amo a bagunça que fazem quando estão saindo daquilo, daquele cilindro que voa. Eu amo quando todos trocam suas bagagens e roçam na bunda da gente como se estivéssemos num ônibus na hora do rush em plena Praça XV...
Isso quer dizer que chegamos vivos - o que hoje em dia é meio duvidoso adivinhar.
Controle de Vôo.
Os controladores de vôo sabem o que fazem. Eles não iriam mexer com toda uma sociedade à toa. Eu não sei o que acontece, mas sei que ninguém iria incomodar o povo brasileiro e os turistas de todo este mundão de Deus se não houvesse riscos.
Eu sou médica e me senti diante de uma mesa cirúrgica, prestes a ser cortada e anestesiada. Se não é uma tripulação competente e controladores de vôo trabalhando eficientemente, eu poderia ter passado desta pra melhor...
A gente nem percebe o que acontece nos bastidores. É relevante que prestemos atenção a quem está “controlando” nossas vidas.
Cheguei em Goiás com o sorrisinho da minha amiga, que não via há tanto tempo, e a única coisa que pude dizer foi:
“Pô, os motoristas de Goiás são uns merdas!”.
Ela riu e observou, como toda psicóloga, que eu estava botando os bichos pra fora. Ela me perguntou se tinha trazido bagagem.
“Claro! E nem me interesso mais pelos desodorantes e os perfumes! Quero que tudo vá pra PQP!”.
Ela, pacientemenmte, pegou o que sobrou da bagagem e me colocou num carro. Logo eu mostrei que não tinha mudado nada desde o nosso último contato.
Senti o calor de Goiás - quente, contudo menos úmido que o Rio, céu grandioso, tudo aberto, largo...
O calor não incomodava. Olhei para os lados, mesmo estando a muitos quilômetros de distância de meu Estado, mas me senti ainda no Brasil -com brasileiros iguais a mim, do mesmo jeito, com a mesma cara, com a mesma língua.
A imensidão se subjuga à unidade da nossa cultura.
Sentei no carro de minha amiga e comecei a viver o Centro-Oeste.

Leila Marinho Lage
Rio, 07 de abril de 2007


Leila Marinho Lage
Enviado por Leila Marinho Lage em 17/08/2007
Alterado em 21/02/2009
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